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Sobre quando Babilônia se tornou potência regional

E toda esta terra será reduzida a ruínas e se tornará um motivo de terror, e essas nações terão de servir ao rei de Babilônia por 70 anos (Jeremias 25:11).

Consoante com o verdadeiro significado dos 70 anos, conforme visto na postagem anterior, por agora vale perguntar quando começou o período de dominação da Babilônia sobre as nações vizinhas de Judá.

A Torre de Vigia coloca o início do período no ano da destruição de Jerusalém e lhe atribui o significado de desolação, devastação, para a terra de Judá. A profecia explicitamente diz tratar-se de um período de servidão a Babilônia por parte de nações vizinhas. O que revelam os fatos históricos da época?

Na sua lista de sete potências mundiais, a Torre de Vigia coloca a Assíria antes de Babilônia. Por aquela época, a Assíria dominava toda a região da Babilônia, como pode ser visto no mapa abaixo.


Como o império assírio se tornou muito vasto, era comum que governadores fossem colocados para administrar partes do império. E assim fazia Assurbanipal, o último grande rei da Assíria; em 647 a.C., no seu 22º ano de reinado, ele nomeou Kandalanu governador da região de Babilônia. Porém, não é raro que a morte de um imperador acabe por criar um vazio de poder no império e propicie revoltas. Foi o que aconteceu após a morte de Assurbanipal (por volta de 630 a.C. ou algum tempo depois); seus sucessores não conseguiram mais efetivo controle sobre a região, e a morte de Kandalanu, na Mesopotâmia, permitiu que Nabopolassar assumisse o controle da região e se proclamasse rei da Babilônia em 625 a.C. A essa altura, o Egito também já se libertara da Assíria e ganhava controle sobre a região de Judá e até os limites da Mesopotâmia. Nesse meio tempo, Nabucodonosor, o filho de Nabopolassar e futuro rei da Babilônia, também ganhava terreno dos assírios, e, juntamente com os medos, tomou a capital assíria em 612 a.C. Três anos depois, a última resistência assíria foi derrotada em Harã.

Com isso, ficou o cenário perfeito para a batalha de Carquemis, em 605 a.C, que colocará em lados opostos o exército de Nabucodonosor e o exército egípcio sob comando do faraó Neco II.

Os leitores da Bíblia podem ler sobre o resultado dessa guerra no capítulo 46 de Jeremias.

(Jeremias 46:2) Para o Egito, a respeito do exército de Faraó Neco, rei do Egito, que estava junto ao rio Eufrates, em Carquemis, quando foi derrotado por Nabucodonosor, rei de Babilônia, no quarto ano de Jeoiaquim.

A batalha também é relatada com muitos detalhes em um registro babilônico de nome BM 21964. Os colchetes foram acrescentados por Jonsson para fim de clareza; Acade é um nome para a região do império, cuja capital era Babilônia.

[Vigésimo primeiro ano]: O rei de Acade ficou em casa (enquanto) Nabucodonosor (II), seu filho mais velho (e) príncipe coroado, reuniu [o exército de Acade]. Ele assumiu o comando de seu exército e marchou para Carquemis que se encontra às margens do Eufrates. Ele atravessou o rio [para encontrar o exército do Egito] que estava acampado em Carquemis. [...] Eles batalharam entre si. O exército egípcio bateu em retirada diante dele. Ele infligiu uma [derrota] sobre eles (e) os destruiu completamente. No distrito de Hamate o exército de Acade alcançou o restante do exército do [Egito que] conseguira escapar [da] derrota e que não tinha sido vencido. Eles (o exército de Acade) infligiram uma derrota sobre eles (de tal modo que) nem um único homem (egípcio) [voltou] para casa. Nessa época Nabucodonosor (II) conquistou completamente Ha[ma]te.

Durante a guerra, Nabucodonosor recebe a notícia de que seu pai faleceu em Babilônia e ele volta à capital para assumir o trono. O registro continua:

Por vinte e um anos Nabopolassar reinou em Babilônia. No dia oito do mês de ab ele morreu. No mês de elul Nabucodonosor (II) retornou para Babilônia e no primeiro dia do mês de elul ele ascendeu ao trono real em Babilônia.

Na continuação do registro, conta-se que Nabucodonosor volta para o campo de batalha nesse mesmo ano, em 605 a.C., e também no ano seguinte, em seu primeiro ano de reinado:

Em seu ano de ascensão, Nabucodonosor (II) voltou para Hatu. Até o mês de sebate ele marchou vitoriosamente em Hatu. No mês de sebate ele levou o imenso despojo de Hatu para Babilônia. Primeiro ano de Nabucodonosor (II): No mês de sivã ele reuniu seu exército e marchou para Hatu. Até o mês de quisleu ele marchou vitoriosamente em Hatu. Todos os reis de Hatu vieram à sua presença e ele recebeu deles o imenso tributo (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados, páginas 238-240).

O significado de Hatu, conforme usado no registro babilônico, é muito importante para a compreensão do assunto em exame:

Como Wiseman destacou, Hatu era um termo geográfico que naquela época abrangia aproximadamente a Síria e o Líbano. Conforme é defendido pelo Dr. J. D. Hawkins em Reallexikon Assyriologie, ‘em sentido ampliado’, incluía também a Palestina e a Fenícia (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados, página 240).

[No seu primeiro ano de reinado] Nabucodonosor empreendeu outra campanha em Hatu para manter seu domínio sobre os territórios conquistados. Há registros de campanhas similares nos anos seguintes. Claramente, as nações na área de Hatu se tornaram vassalas de Babilônia logo após a Batalha de Carquemis. O curso dos setenta anos de servidão evidentemente já tinha começado. (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados, página 241).

Como mostra a imagem abaixo, a batalha de Carquemis fez o Egito se recolher para as suas terras originais e toda as nações vizinhas de Judá ficaram agora sob domínio de Babilônia, a quem serviriam e pagariam tributos. Era o ano de 605 a.C, que correspondia ao 4º ano de Jeoiaquim como rei de Judá e ao ano de ascensão de Nabucodonosor como rei de Babilônia.


Assim, no mesmo ano em que foram proferidas, a profecia de Jeremias já era descritiva do seu verdadeiro significado, isto é, que nações vizinhas serviriam ao rei de Babilônia, e não que, 18 anos depois, com a destruição de Jerusalém, se iniciaria um período de 70 anos de devastação para a terra de Judá.



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