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Junções de interligação cronológica

Só há dois modos possíveis de estender o período neobabilônico para incluir os vinte anos extras exigidos pela cronologia da Torre de Vigia: Ou os reis neobabilônicos conhecidos tiveram reinados mais longos do que o indicado por todos os documentos discutidos [anteriormente], ou havia outros reis desconhecidos que pertenceram à era neobabilônica além dos que conhecemos através desses documentos. (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados, página 151).

Pelo exame das cinco evidências apresentadas até aqui, está descartada a possibilidade de os reis conhecidos terem reinado por mais tempo do que se sabe agora. Neste artigo vamos verificar se é razoável acreditar que outros reis podem ter reinado em intervalos entre os reis conhecidos.

De Nabucodonosor a Evil-Merodaque

A literatura da Torre de Vigia reconhece que Nabucodonosor era rei de Babilônia quando a cidade de Jerusalém foi destruída. E aqui consta a primeira pergunta: quem sucedeu a Nabucodonosor? Sem exceção, o nome Evil-Merodaque tem aparecido em todas as listas de reis desse período, seja qual for a evidência em estudo.

Dentre os muitos milhares de documentos comerciais oriundos da antiga Babilônia e guardados no Museu Britânico, a B.M. 30254 é especial aqui. De acordo com informações colhidas por Jonsson, no mês de Ajaru (2º mês), no 43º ano de Nabucodonosor, Nabu-ahê-idina, que já foi assunto no artigo anterior, passou a ter à sua disposição uma escrava, pela qual foi estabelecida uma penhora, e meses depois Nabu-ahê-idina compra a escrava. A compra é datada do mês de Quislimu (9º mês) do mesmo ano, mas referente ao período de ascensão de Evil-Merodaque. Dessa forma, visto que essas datas estão separadas por apenas sete meses, o documento aqui em análise descarta qualquer possibilidade de um outro rei ter reinado entre Nabucodonosor e Evil-Merodaque (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados, página 152).

A própria Bíblia apresenta informações que liga o final do reinado de Nabucodonosor ao começo do reinado de Evil-Merodaque. Veja a discussão dessa evidência neste artigo, debaixo do subtópico Inconsistência na transição de Nabucodonosor para Evil-Merodaque.

De acordo com o livro Babylonian Chronology, documentos foram datados com o nome de Nabucodonosor até o sexto mês; deste mês em diante, documentos passaram a ser datados com o nome de Evil-Merodaque.

De Nabucodonosor a Evil-Merodaque e a Neriglissar.

O Livro-Razão NBC 4897 registra o crescimento anual de um rebanho durante 10 anos, do 37º ano de Nabucodonosor até o 1º ano de Neriglissar. Para o 1º ano de Neriglissar assim declara:

Total geral: 922, 1º ano de Nergal-sharra-usur, rei de Babilônia, foram recebidos 9 cordeiros em Uruque (e) 3 cordeiros para tosquia (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados, página 154).

Declarações semelhantes são feitas desde o 37º ano de Nabucodonosor, e o nome de Evil-Merodaque é especificado como rei entre Nabucodonosor e Neriglissar. Se algum outro rei houvesse reinado por pelo menos um ano entre Nabucodonosor e Evil-Merodaque, ou entre Evil-Merodaque e Neriglissar, o 10º ano do livro-razão jamais coincidiria com o primeiro ano de Neriglissar (Uma discussão mais ampla desse assunto pode ser verificada no artigo de Carl Olof Jonsson em resposta à Sentinela de novembro de 2011).

De acordo com o livro Babylonian Chronology, documentos foram datados com o nome de Evil-Merodaque até o quinto mês; deste mês em diante, documentos passaram a ser datados com o nome de Neriglissar.

De Neriglissar a Labashi-Marduque

Um documento da coleção da Universidade de Yale, com nome YBC 4012, relata que um homem viajou de Uruque para Babilônia com o objetivo de tratar de negócios. O documento foi escrito em Babilônia e é datado do 2º mês, no ano de ascensão de Labashi-Marduque. O ponto de interesse deste documento é que ele também relata que o homem partiu para Babilônia dois meses antes, no 12º mês do 3º ano do reinado de Neriglissar. Portanto, estes dois meses são tempo insuficiente para ter havido um outro rei entre Neriglissar e Labashi-Marduque (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados, páginas 156, 157).

De acordo com o livro Babylonian Chronology, documentos foram datados com o nome de Neriglissar até o primeiro mês; deste mês em diante, documentos passaram a ser datados com o nome de Labashi-Marduque.

De Neriglissar a Labashi-Marduque e a Nabonido

Um documento jurídico do tempo de Nabonido, com nome de Nabon. nº 13, relata um caso tratado pelos juízes de Nabonido. No penúltimo mês do ano de ascensão de Nabonido, uma mulher de nome Belilitu queixa-se aos juízes que possui uma promissória emitida por Nabu-ahê-idina durante o 1º ano do reinado de Neriglissar, e que a nota permanece não paga. Nabu-ahê-idina é chamado para se explicar e verifica-se que, na verdade, a mulher queria receber uma vez mais o valor negociado. Pelo que se verificou em artigos anteriores, Neriglissar reinou por três anos completos, após seu período de ascensão. No seu 4º ano de reinado ocorre a transição de Neriglissar para Labashi-Marduque, que governou por cerca de dois meses, e então, nesse mesmo ano, ocorre a transição entre Labashi-Marduque e Nabonido. Portanto, referente aos dados apresentados pela Nabon nº 13, vê-se que se passaram três anos e alguns meses entre a assinatura da promissória e a apresentação do caso junto aos juízes de Nabonido. A questão aqui é sobre quanto tempo pode-se esperar para cobrar uma dívida e dizer que a dívida foi cobrada dentro de um prazo razoável. Três anos pode ser um prazo razoável nos dias de hoje, mas a cronologia da Torre de Vigia precisa de 20 anos! Definitivamente não é razoável esperar que esses 20 anos, ou algo perto disso, tenham se passado num ou noutro dos dois intervalos entre esses três reis.

De acordo com o livro Babylonian Chronology, documentos foram datados com o nome de Labashi-Marduque até o terceiro mês; mesmo a partir do segundo mês começou-se a datar documentos com o nome de Nabonido, uma indicação de que Labashi-Marduque pode não ter sido reconhecido como rei por toda a Babilônia.

De Nabonido a Ciro

A Crônica de Nabonido é uma tabuinha de argila que relata eventos importantes do reinado de Ciro, que atualmente sabe-se que durou 17 anos. Infelizmente a parte que relata eventos do que seria o seu 17º ano está danificada, o número que se esperaria estar lá não pode ser conferido. Em um trecho traduzido pela Torre de Vigia é possível ler sobre o ataque de Ciro à cidade de Babilônia e a consequente prisão de Nabonido. Neste ponto, mesmo com a impossibilidade de se conferir a data dos eventos narrados, é explícito que o reinado de Nabonido termina com a chegada de Ciro a Babilônia, o que evidentemente elimina a possibilidade de outro rei ter reinado em Babilônia após a prisão de Nabonido.

De acordo com o livro Babylonian Chronology, documentos foram datados com o nome de Nabonido até o sétimo mês; deste mês em diante, documentos passaram a ser datados com o nome de Ciro.

O outro lado

Quando aborda assuntos aleatórios, a Torre de Vigia costumeiramente reconhece que os reis babilônios sucederam um ao outro tal como dizem os historiadores, isto é:
  • que Nabucodonosor foi sucedido por Evil-Merodaque; a - b - c - d
  • que Evil-Merodaque foi sucedido por Neriglissar; a - b - c
  • que Neriglissar foi sucedido por Labashi-Marduque; a
  • que Labashi-Marduque foi sucedido por Nabonido; a - b
  • que Nabonido foi sucedido por Ciro. a - b
Ocorre que a organização religiosa não é coerente neste assunto quando trata especificamente sobre cronologia; visto que precisa defender os seus cálculos que dão suporte à data de 1914, ela necessariamente precisa argumentar que não se pode ter certeza que os reis babilônios sucederam um ao outro tal como se pode ler nos melhores livros de história da Mesopotâmia. Por exemplo, em um artigo de 2011, quando foi forçada a reconhecer que os documentos datados da antiga Babilônia apontam que Jerusalém foi destruída na data de 587 a.C., ela precisou contornar as evidências com a seguinte declaração:

Mas esse método de datação só é válido se cada rei sucedeu ao próximo imediatamente, sem que outros tenham governado entre eles (A Sentinela de 1º de novembro de 2011, página 24).




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