Pular para o conteúdo principal

Eclipses lunares

As nove evidências fornecidas até agora são mais do que suficientes para confirmar a correção da ideia de que Jerusalém foi destruída pelos babilônios em 587 a.C. Mesmo sem as primeiras sete evidências, as duas últimas são absolutas, independentes de outras, e por si só constituem provas definitivas da precisão da data de 587 a.C. Portanto, esta última evidência, relacionada aos eclipses lunares, apenas se adiciona às várias outras evidências que, até agora, foram pouco defendidas ou nem mesmo abordadas pela Torre de Vigia.

As informações sobre eclipses neste artigo foram analisadas com base nos dados gerais apresentados na introdução do artigo sobre posições lunares. Além disso, é importante considerar o conteúdo das notas 1 e 2 do referido artigo bem como também consultar o artigo Calculando hora de início e término de eclipse. As fontes utilizadas incluem o livro "Babylonian Eclipse Observations from 750 BC to 1 BC", de Peter J. Huber e Salvo De Meis, assim como o arquivo online no GitHub mantido por jacob-pro. Quando a descrição estiver disponível em português no livro "Os Tempos dos Gentios Reconsiderados", esta fonte será citada em detrimento das outras.

LBAT 1417

Este registro aborda quatro descrições de eclipses, que seguem um padrão de ocorrer a cada 18 anos, conhecido como o ciclo saros, mencionado em um artigo anterior. As descrições dos eclipses referem-se ao período durante os governos dos babilônios Samas-sum-iuquin e Kandalanu.

A primeira descrição está parcialmente danificada, e, por isso, não será discutida aqui. A segunda descrição faz alusão ao ano de ascensão de Samas-sum-iuquin, o qual, conforme explicado em um artigo anterior na discussão sobre o planeta Saturno, corresponde ao ano de 668 a.C. Com base na declaração de que o eclipse ocorreu no segundo mês, deduz-se que tenha acontecido nos primeiros meses do calendário babilônico, que coincidem com a primavera (HN) do ano de 668 a.C. De fato, o catálogo de eclipses da NASA registra apenas dois eclipses lunares para o ano de 668 a.C. — sendo um deles datado de 2 de maio, aproximadamente na época do segundo mês do calendário babilônico. Verifica-se que esse eclipse ocorreu durante o dia, foi parcial e tem seu auge às 10:24 daquele dia. Se ocorreu durante o dia, não foi visível em Babilônia, o que também confirma a descrição. O registro astronômico ainda destaca que o evento começou 40º (160 minutos) após o nascimento do Sol; considerando que o Sol nasce às 5:20, isso coloca o início do eclipse em torno das 8:00. O catálogo da NASA indica que o eclipse começou às 9:15, enquanto o Stellarium sugere um início por volta de 9:10. Dada a natureza calculada do eclipse, a divergência de aproximadamente uma hora e quinze minutos está dentro da margem de erro para eclipses obtidos por cálculos, conforme explicado em uma nota de rodapé no livro de Carl Olof Jonsson.

Se aceitarmos a data de 607 a.C. como o ano da destruição de Jerusalém, então a ascensão de Samas-sum-iuquin teria que ter ocorrido 20 anos antes, em 688 a.C. Nesse ano, dois eclipses lunares foram registrados, sendo que um deles ocorreu durante a primavera, em 11 de junho. No entanto, sabe-se que ocorreu durante a noite, não foi um eclipse “que passou”.

O terceiro eclipse mencionado na LBAT 1417 está registrado como ocorrido durante o 18º ano do governo de Samas-sum-iuquin, que teve início na primavera de 650 a.C. Segundo a descrição, foi um eclipse que teve lugar no segundo mês, iniciando quatro horas (240 minutos) antes do ocaso do Sol, ou seja, durante o dia. De fato, houve três eclipses lunares naquele ano, sendo um deles registrado na primavera, especificamente em 13 de maio. Conforme o catálogo da NASA, esse eclipse foi parcial, teve início às 16:38 e terminou às 18:31, alguns poucos minutos antes do ocaso do Sol, e apenas a sua fase penumbral se estendeu até às 19:54; portanto, foi um eclipse “que passou”. De acordo com a Torre de Vigia, esse eclipse deveria ser procurado na primavera de 670 a.C. Houve dois eclipses naquele ano, sendo um deles na primavera. No entanto, ao contrário do que diz a descrição, esse ocorreu pela manhã, começando por volta das 7:40.

O quarto e último registro de eclipse da LBAT 1417 aborda um evento astronômico ocorrido no 16º ano do governo de Kandalanu (632 a.C), que sucedeu aos 20 anos do governo de Samas-sum-iuquin. O texto indica que o evento aconteceu no terceiro mês, sugerindo que devemos buscar esse eclipse na primavera de 632 a.C. De fato, dois eclipses ocorreram naquele ano, sendo um deles registrado em 24 de maio, durante a primavera, com uma duração de 75 minutos — um tempo bem próximo dos 80 minutos relatados na descrição. A riqueza de detalhes da descrição, o fato de o eclipse ter ocorrido durante a noite e a pequena discrepância de apenas cinco minutos na duração compõem forte evidência de que se trata de um eclipse observado. Conforme a cronologia da Torre de Vigia, o 16º ano do governo de Kandalanu corresponde a 652 a.C. Nesse ano, ocorreram três eclipses, incluindo um em 2 de julho, que, eventualmente, podia abranger o terceiro mês do calendário babilônico. No entanto, é importante observar que esse eclipse ocorreu durante o dia, encerrando-se por volta às 18:40 — uns 30 minutos antes do nascimento da Lua.


LBAT 1419


O registro astronômico denominado LBAT 1419 apresenta vários eclipses lunares que ocorreram em intervalos de 18 anos, abrangendo o período de 609 a 447 a.C. A primeira parte do registro, até março de 591 a.C., está danificada, de modo que as informações estão ilegíveis. Mas três registros subsequentes são legíveis e, como os eclipses registrados estão dentro do período neobabilônico, são úteis ao nosso propósito, que é checar se o reinado de Nabucodonosor começou realmente em 604 a.C., como afirmam os historiadores, ou se começou em 624 a.C., como alega a Torre de Vigia.

O primeiro registro, datado do 14º ano de Nabucodonosor, trata de um eclipse que "passou", ou seja, não foi visível em Babilônia, e que teria ocorrido nas primeiras horas do dia. Além disso, menciona que ocorreu no sexto mês, indicando que deve ser procurado por volta do oitavo ou nono mês do calendário juliano. Se aceitarmos que Nabucodonosor começou a reinar em 604 a.C., seu 14º ano de reinado corresponderia a 591 a.C. Nesse ano, houve dois eclipses, e um deles ocorreu em 15 de setembro, começando às 5:57, cerca de 20 minutos após o ocaso da Lua, conforme descrito no registro astronômico. De acordo com os cálculos da Torre de Vigia, o 14º ano do reinado de Nabucodonosor seria 611 a.C; no entanto, nesse ano, houve apenas um eclipse dentro do período esperado, e ele começou na primeira parte da noite, não nas primeiras horas da manhã.

A segunda descrição de eclipse legível na LBAT 1419 é datada do 32º ano de Nabucodonosor, que corresponderia ao ano de 573 a.C. Assim como no caso anterior, esse eclipse também ocorreu no sexto mês, durante o dia, e teria tido início 140 minutos antes do ocaso do Sol. No ano de 573 a.C., houve realmente dois eclipses, e um deles ocorreu em 25 de setembro, que está dentro do período esperado. Este eclipse começou às 13:39 e terminou às 17:29, cerca de 30 minutos antes do ocaso do Sol. De acordo com as contas da Torre de Vigia, esse eclipse deveria ser localizado no ano de 593 a.C.; no entanto, não ocorreu nenhum eclipse nos meses oito ou nove daquele ano. Houve um eclipse em 7 de outubro, mas foi do tipo penumbral e ocorreu nas primeiras horas da manhã, não durante a tarde.

O próximo eclipse legível na LBAT 1419 é repleto de detalhes; como o ano do rei está ausente, são justamente os detalhes que possibilitam a sua identificação com o ano de 555 a.C. De acordo com o registro, o eclipse ocorreu no sétimo mês (setembro ou outubro no calendário juliano), foi total e pôde ser visto do começo ao fim. Além disso, acrescenta que a Lua podia ser vista na constelação de Áries. Quando se recorre ao catálogo de eclipse da Nasa, verifica-se que durante o século VI ocorreram oito eclipses totais durante setembro ou outubro na região assinalada como “Ásia e Ásia Menor”(veja aqui e aqui); desses oito, apenas dois foram visíveis em Babilônia: um em 6 de outubro de 555 a.C. e outro em 16 de setembro de 526 a.C. De posse dessas informações, verifica-se no Stellarium que apenas no eclipse de 555 a.C. a Lua pode ser vista na constelação de Áries.

O eclipse tratado no parágrafo anterior ainda tem a propriedade de ter ocorrido um ciclo de saros à frente, ou seja, ocorreu 18 anos após o eclipse de 25 de setembro de 573 a.C. Como aquele ocorreu no 32º ano do reinado de Nabucodonosor, este reforça significativamente o anterior, fixando em definitivo que, se o 32º ano de Nabucodonosor foi em 573 a.C., ele só pode ter começado a reinar em 604 a.C., não 20 anos antes, em 624 a.C., como defende a Torre de Vigia.

LBAT 1420

A inscrição LBAT 1420 registra uma série de eclipses que aconteceram durante o reinado de Nabucodonosor. A datação desses eclipses é feita com base na primeira linha, onde parte do nome de Nabucodonosor é mencionada. A confirmação da época é obtida ao se observar que os eclipses registrados são consistentes com os anos do reinado de Nabucodonosor, que começou em 604 a.C., conforme outras fontes já analisadas. Como há muitos eclipses registrados, apenas dois serão discutidos aqui. Eles ocorreram durante o 11º ano do reinado do monarca babilônio, que decorre da primavera de 594 à primavera de 593 a.C.

A descrição diz que o primeiro eclipse foi total e ocorreu no segundo mês, que abrange parte de abril e parte de maio; referente ao segundo, diz que ocorreu no oitavo mês, que abrange parte de outubro e parte de novembro, e que foi um “que passou”, isto é, não foi visível em Babilônia.

Quando se recorre ao catálogo de eclipse, verifica-se que ocorreram dois eclipses no ano de 594 a.C. e ambos satisfazem a descrição. O primeiro ocorreu em 23 de maio, foi total e começou às 20:21; o segundo ocorreu em 17 de novembro, foi parcial e começou nas primeiras horas da manhã, o que tornou impossível que fosse visto em Babilônia.

Nas contas da Torre de Vigia, Nabucodonosor começou a reinar em 624 a.C.; consequentemente, o seu 11º ano de reinado corresponderia a 614 a.C. Nesse ano não houve nenhum eclipse total na primavera. Embora tenha ocorrido um eclipse em novembro, apenas o começo desse eclipse não foi visível em Babilônia; com essa característica, não se pode dizer que foi um eclipse “que passou”.


LBAT 1421

“A parte preservada da LBAT 1421 registra dois eclipses observados em Babilônia no sexto e no décimo segundo mês do ano “42”” (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados, página 215). Deduz-se que se trata do ano 42 de Nabucodonosor, visto que desconhece-se qualquer outro rei de Babilônia que tenha tido um reinado tão longo.

O registro astronômico trata de dois eclipses que ocorreram em Ululu, sexto mês (por volta de agosto ou setembro), e em Adaru, décimo segundo mês (por volta de fevereiro ou março). A respeito do primeiro, diz que a Lua nasce eclipsada; sobre o segundo, declara que foi um eclipse total (25º = 100 minutos de duração). Se se aceita que Nabucodonosor começou a reinar em 604 a.C., o seu 42º ano de reinado decorreria da primavera de 563 à primavera de 562 a.C. Não há qualquer dificuldade em localizar esses eclipses em catálogos modernos. O primeiro ocorreu em 5 de setembro, foi parcial e começou às 17:07, enquanto a Lua estava abaixo do horizonte, e se estendeu até às 19:14, cerca de 40 minutos após o nascimento da Lua. O segundo eclipse ocorreu na noite de dois para três de março de 562 a.C; a sua fase total durou de 0:26 às 2:10, uma duração de 104 minutos.

Nas contas da Torre de Vigia, esses eclipses deveriam ser procurados 20 anos antes, em 583/82 a.C. Referente ao segundo eclipse, não houve qualquer eclipse total nos primeiros meses de 582 a.C. Sobre o primeiro, houve um eclipse parcial em 16 de outubro, que começa às 19:55; no entanto, esse eclipse começou mais de duas horas após o nascimento da Lua, de modo que não se pode dizer que ela “nasceu eclipsada”.


O outro lado

Em seus artigos de 2011 sobre cronologia, a Torre de Vigia faz uma breve análise sobre um eclipse citado pela VAT 4956, conclui que ele apoia a sua data de 607 a.C. e ignora toda e qualquer evidência adicional, como as apresentadas neste artigo. 

O eclipse citado pela VAT 4956 deve ser visto no seu contexto, que é referente às posições lunares. Se a quase totalidade das descrições referente a posições lunares, datadas do ano de 568 a.C., apoia a data de 587 a.C. para a destruição de Jerusalém, o eclipse citado no documento astronômico seria uma gritante exceção se apoiasse a data da Torre de Vigia. Como a única informação referente a ele é que foi um eclipse "omitido", isto é, que não foi visível em Babilônia, em razão de ter ocorrido durante o dia, não há qualquer motivo para descartá-lo como uma informação destoante das demais.  O único argumento da Torre de Vigia é se servir de um eclipse de 588 a.C., que ocorreu também no mês de julho, e que foi igualmente um eclipse diurno, para tentar causar incerteza sobre quais das duas datas se refere o documento astronômico. Como a data de 588 a.C. lhe é desejável, a outra é assim descartada. Não é, definitivamente, um argumento que possui a devida fundamentação. 




(sumário <> voltar <> avançar <> perfil do autor). 



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Posições lunares

O estudo da VAT 4956 entre dissidentes ex-Testemunhas de Jeová ganhou relevância depois que a Torre de Vigia, em 2011, passou a dar credibilidade a esse registro astronômico. No entanto, como mostrado no artigo anterior , a Torre de Vigia passou a usar esse registro porque foi convencida, sabe-se lá por quem, que a peça de argila apoia a data de 607 a.C. para a destruição de Jerusalém. Diante da mudança de posição, dissidentes ex-Testemunhas pelo mundo debruçaram-se sobre o documento e verificaram que esse não é o caso, isto é, que ele não apoia a data de 607 a.C.; em vez disso, apresenta provas irrefutáveis de que Jerusalém foi destruída em 587 a.C. — a data que a Torre de Vigia se recusa a aceitar. Em língua portuguesa, conheço um único artigo, que foi produzido pelo site Mentes Bereanas , mas ele se restringe a análise sobre posições lunares. Em inglês, o trabalho de Doug Mason sobre cronologia inclui uma profunda análise sobre a VAT 4956, que pode ser baixada nestes links: parte 1

Sumário

PARTE I - CONCEITOS E INTRODUÇÃO 01 - 1914 - O calcanhar de Aquiles da Torre de Vigia 02 - Informações sonegadas nos livros de estudos 03 - O depoimento de Raymond Franz 04 - A reação do Corpo Governante às pesquisas de Jonsson 05 - Confusão matemática nos cálculos da Torre 06 - Combinação ano a ano / Reis de Babilônia, Judá e Egito 07 - O cativeiro da Babilônia Os 70 anos 08 - Os 70 anos da profecia 09 - O que realmente diz a profecia dos 70 anos 10 - Sobre quando Babilônia se tornou potência regional 11 - Sobre quando começou e terminou o período de dominação 12 - Como ler Daniel 1 13 - Setenta anos "em" Babilônia? 14 - Os "70 anos" de Daniel e Crônicas 15 - Os "70 anos" de Zacarias Os "Sete Tempos" 16 -  Os "sete tempos" - significam mesmo 2520 anos? 17 - Jesus Cristo - quando realmente se tornou rei? PARTE II - CRONOLOGIA RELATIVA 18 - Cronologia relativa - fontes e metodologia 19 - Os reis da era neobabilônica 20 - ( Evid 1 )  His

A Torre de Vigia revisita a VAT 4956

Se você conhece cada cena de um filme que começou a ser exibido às 22 horas e o minuto correspondente a cada cena, você sabe exatamente quanto tempo se passou desde as 22 horas se alguém lhe diz qual cena se passa agora na tela da TV. Pode-se dizer que o céu é como um filme que começou há muitas eras. Graças aos movimentos padronizados de milhares de astros, principalmente Sol, Lua, estrelas e planetas — e eclipses —, desenvolveu-se sofisticados programas que nos tornam capazes de voltar para cenas anteriores e verificar qual era a cena do filme celeste vista pelos povos antigos há milhares de anos. Dessa forma, se temos em mãos um documento da antiguidade e somos capazes de ler a descrição da posição combinada de dois ou mais astros, e de astros em relação às suas posições no céu, podemos ser capazes de dizer em qual ano, e até qual dia e hora, ocorreu a cena celeste descrita. Mas alguém pode dizer que, justamente pelo fato de os movimentos dos astros serem padronizados e se repetire